quinta-feira, novembro 30, 2006



Garota do Fogo

Pego a sombra e a luz e faço você. Determino tua simetria com a ponta dos dedos, num desenho simples, infantil e sincero, como as coisas simples, infantis e sinceras têm de ser. Boto fogo nos teus cabelos. O vermelho me atrai. Respiro fumaça e te beijo na boca. Nessa hora o mundo gira ao contrário, o ardido não dói, a xícara descai, as palavras se desescrevem, desescrev, desesc. Concentre-se na vertigem e suspire. Agora você consegue sentir o bem e o mal, o certo e o errado, doce e salgado, riso e choro. Tua pele é folha em branco onde meu calor te escreve com grão de ardósia, tabaco, pimenta e perfume.
Eu posso ler tudo em você, exatamente na altura do teu colo. Tateio feito cego em braile e descubro Baudelaire em todos os teus poros. Tua cor de neve incendeia meu sofá, bagunça minhas gavetas, acorda meus vizinhos. Este é o momento, esta é a hora em que as horas não têm mais sentido, mas nós temos. E usamos o sexto para subverter, pilhar, massacrar, porque a vida é uma só, o sapato aperta e o padeiro não tem troco. É preciso correr na grama e perder o fôlego, enfim. No fim, eu seguro tua mão e está tudo bem. E você agradece.
Ei, obrigada.
Ei, de nada.

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